sexta-feira, 10 de abril de 2009

NO NATAL, ELE SE FOI...

PARTE IV

VIAJAMOS A EREXIM - UMA ODISSÉIA...


Na verdade eu estava morrendo de pena do meu pai. Tentava esconder de todas as formas a real gravidade da doença, utilizando-me de subterfúgios que em outros momentos jamais o convenceriam. Mas, como eu já disse, o cérebro da gente parece ser dotado de uma defesa natural contra isso. Talvez ele sempre soubesse que estava condenado, mas parecia acreditar em tudo o que eu dizia. E também por isso ele passou a se apegar cada vez mais em mim. Como eu lhe passava impressões positivas, tomava as iniciativas e o acompanhava em todos os procedimentos médicos e exames, passei a ser uma espécie de rocha onde ele depositava todas as suas mais íntimas expectativas. De certa forma, ficou totalmente dependente de mim em seu drama pessoal. É claro que o carinho dos meus irmãos e de minha mãe tornaram-se imprescindíveis. Todos passamos a mover nossa atenção para desenrolar dos fatos, mas como eu tomara a frente, todos ficaram na expectativa e prontos para ajudar quando fossem instados. A esta altura já havíamos comunicado a toda a família e a comoção era geral. Lembro que o primeiro dos tios a saber foi o Luiz Bavaresco. Liguei pra ele logo depois de obter a confirmação do diagnóstico. Depois liguei pra Caxias do Sul e informei ao Kuty, pois não tinha coragem de contar diretamente para a tia Maria. Nem lembro como a notícia chegou à tia Marilene.
Mas vamos à viagem.

Naquela manhã, acordei muito cedo. Dormi mal. A consulta estava marcada para as 9 horas e eu havia decidido buscar ele em Paim Filho e fazer o trajeto até Erexim indo por Tapejara, o que aumentava em quase 100 Km a viagem. Mas era asfalto. Meu carro era novo, não tinha mais do que 10.000Km e colocá-lo para rodar naquele trecho estupidamente horrível de 28 Km entre Maximiliano de Almeida e Pinhalzinho era uma tortura. De modo que eu precisava estar em Paim às 6 horas da manhã. Às quatro eu estava de pé. Tomei um café forte e peguei a estrada. Deixei a Neu e a Gabi dormindo e me despedi com um beijo. A Neu me pediu calma e que ligasse informando do andamento.
De certa forma eu estava tranqüilo. Precisava estar. Eu tinha que passar otimismo tanto para ele quanto para a mãe. Durante a viagem até Paim, meditei muito sobre como conduzir as conversas com eles, escolhi palavras e frases.
Cheguei lá às 5:40 h. Soube que estavam de pé desde as 3 da madrugada. O pai não havia conseguido dormir. O laxante era mesmo muito potente. Passara a noite sentado no vaso sanitário. Voltava para a cama, deitava, quinze minutos depois ouvia-se estrondos magníficos vindos do banheiro...
Prevendo o que ia acontecer durante a viagem, pedi que levasse junto um rolo de papel higiênico.
Enquanto ele ia ao banheiro uma última vez, sobrou um espaço para conversar sozinho com a mãe. Foi neste momento que eu lhe contei toda a verdade. Chorou muito. Acho que ela já sabia que sua vida estava para sofrer um terrível abalo, que boba ela não era. Porém, com a cabeça no meu ombro, ela afirmou categoricamente que acreditava que o pai sairia dessa, que ele era um homem forte e que iria vencer a doença. Rapidamente se recompôs. O pai saía do banheiro e precisávamos seguir viagem.
Entre Paim Filho e São João da Urtiga paramos duas vezes. Os abrigos de espera dos ônibus tornaram-se o seu WC, pois não dava pra parar no meio do asfalto sem acostamento. E aos poucos ele descarregava o intestino nas patentes improvisadas. Ríamos muito com a situação e por alguns momentos conseguíamos esquecer do drama que nos esperava.
Nos quilômetros seguintes foram várias paradas. Em Tapejara paramos num posto de gasolina. Em Coxilha também. E daí para frente ele agüentou firme. Estava pronto para o desagradável exame.

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