O ANO BOM
2007 representou mesmo o melhor período de seu estado de saúde. A cada 60 ou 90 dias voltávamos a Erechim para sequência do tratamento e ficávamos felizes com as tomografias realizadas, pois os nódulos permaneciam sob controle. Houve momentos em que os exames se mostraram tão positivos que parecia mesmo que o pai havia entrado num período de recuperação ascendente. Foi várias vezes a Bento Gonçalves com a mãe e outras tantas esteve em nossa casa, para almoçar e conviver conosco, sempre junto com o Nando e sua família. Claro que algumas de suas internações foram mais complicadas que outras, demandando tempos de recuperação um pouco maiores, mas não se repetiu a principal complicação, que era a formação de excesso de líquido no abdômen. Por outro lado, um outro problema passou a me preocupar. A cada exame tomográfico uma nota destoava dos resultados positivos. Dentre as descrições de normalidade dos demais exames, vinha sempre uma observação: “varizes esofágicas” . Eu não dava muita importância a esse detalhe, mas o Dr. Paulo a certa altura viria a me alertar sobre a possibilidade de hemorragias internas em razão disso. Era uma das causas mais freqüentes de mortes entre os pacientes cirróticos. Mas até então eu pouco considerava a questão da cirrose no pai. Nosso foco eram os tumores. O alerta do Dr. Paulo, no entanto, me deixou um tanto preocupado. Soava como se ele quisesse me preparar para um possível problema futuro. Ele nunca tinha apresentando qualquer indício de sangramento no seu aparelho digestivo, por sorte. Mas decerto a experiência do médico lhe apontava para essa possibilidade. E então, a cada novo exame, por ocasião dos procedimentos de controle, passou-se a realizar também endoscopias.
Com o líquido abdominal sob controle, as funções do fígado relativamente bem preservadas, e nenhuma outra complicação aparente, o pai passou a comportar-se quase como se não estivesse doente. Em que pese o vigor físico ter ficado definitivamente para trás, a vida quase voltou ao normal, para nossa alegria. Nem pensávamos tanto que ele estava em uma sobrevida. Era como se de repente ele tivesse tão somente envelhecido e ficado mais fraco. E como mudara o seu aspecto. Dois anos antes, aos 63, era aquele “jovem sexagenário” forte, cheio de vida, alegre e brincalhão e agora um “ancião” de 65 anos, arqueado, magro e enfraquecido pela doença. Mas isso não lhe tirava o bom-humor e a simpatia. As pessoas sentiam prazer em cumprimentá-lo e ver que apesar de tão grave doença ele aparentava tranqüilidade e parecia estar vencendo o inimigo. E quantos amigos lhe visitaram. Pessoas que há muito tempo não lhe viam fizeram questão de uma visita. Recebeu amigos de infância, amigos do Paraná, de Santa Catarina, de Porto Alegre. Muitos deles incrédulos com a notícia de sua doença. Ficavam chocados com sua aparência envelhecida, mas contaminavam-se com seu otimismo e seu bom-humor. Também foram sentidas algumas ausências. Alguns amigos, daqueles que diziam que o pai estava em sua lista de melhores amigos, não o visitaram em momento algum. Talvez tivessem suas razões, talvez não se sentissem bem vendo o pai daquele jeito. Mas ale acusou a ausência desses amigos. Ainda bem que foram poucos. A imensa maioria de seus amigos mais chegados e até de outros nem tanto assim, foram até a casa dele para prestar solidariedade, para ver como ele estava, para perguntar se precisava de algo. E isso bastava para deixá-lo satisfeito e ainda mais contente. O pai em foto de 1977
O ano de 2007 transcorreu assim. Ele trabalhou no plantão da farmácia, jogou muito baralho no Clube com os amigos, visitou seus compadres, freqüentou a missa, foi à Romaria de N.Sa. de Caravággio. Comemoramos com ele a Páscoa, seu aniversário em 25 de Abril, o meu aniversário em Maio, o Natal... Foi um ano muito bom. Foi o ano em que quase esquecemos que ele estava doente. Quase. ***
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