sexta-feira, 31 de julho de 2009

NO NATAL, ELE SE FOI...

PARTE XVI


MAIS FRUSTRAÇÃO...

O tempo apagou alguns detalhes e não estou bem lembrado sobre quem permaneceu por primeiro no albergue com a mãe naqueles dias. O fato é que escalonamos as nossas férias, cada um em sua empresa, de modo que sempre pudesse ficar alguém com ela. Acho que o primeiro a ficar foi o Rodrigo. O fato é que não queríamos deixar ela sozinha em Porto Alegre. A gente se virava, tinha telefone celular, vigor para eventuais caminhadas mais longas. Mas e ela já não era assim tão jovem. Além disso, poderia ser necessário tomar alguma decisão ou outra durante o período da baixa no hospital e com certeza ela não o faria sozinha. Mas a verdade é que o que nos fez tomarmos a decisão de organizar as férias de todos desta maneira foi a percepção de que nossa estada na capital seria mais longa do que o programado. Inicialmente, imaginamos que a cirurgia iria ocorrer no dia marcado, que haveria alguns dias de recuperação e que no máximo em uns 15 dias o pai estaria de volta para continuar o tratamento, talvez, no hospital de Paim Filho ou mesmo em casa. O adiamento foi mesmo um balde de água gelada nesse planejamento. E o pior estava por vir.
Foi marcada uma nova data. Seria na quinta-feira seguinte.
Novamente nos mobilizamos e viajamos para Porto Alegre. Novamente reuniu-se a equipe, só que desta vez sem o Dr. Jorge, que não pode comparecer. Repetiu-se toda a preparação. Chegamos cedo ao hospital, reencontramos o pai, conversamos, falamos com os companheiros de quarto dele...mas tudo se repetiu. Outra vez a notícia de que não seria realizada a cirurgia por falta de UTI. Imagine-se a frustração de todos. Agora já eram mais de 10 dias de internação. 10 dias de albergue para a mãe. 10 dias de cama de hospital para um paciente psicologicamente abalado pela descoberta de uma gravíssima enfermidade. E ante à perspectiva de novo frustrada de uma cirurgia que lhe pudesse devolver a esperança de vida. Era um sentimento indescritível de decepção para todos. Nitidamente o pai sofria muito com isso, mas resignava-se, até por saber que não havia outra alternativa senão aguardar. Na cama ao lado, o paciente Roberto passava por situação semelhante. Ambos eram preparados para cirurgias que não aconteciam... por falta de UTI. Mas que negócio era esse de “falta de UTI”? Não conseguíamos entender como um hospital do porte da Santa Casa podia ter uma deficiência como essa. Éramos acostumados com os atendimentos no interior, onde sobram leitos e UTI’s. Demorávamos a compreender que a capital era onde desembocavam pacientes do Estado inteiro e até de fora dele. E mesmo que a Santa Casa, por ser um hospital de referência, padecia com a falta de vagas para atender a uma demanda cada vez maior. Abalados como estávamos, nossas cabeças começavam a se deixar levar por idéias mirabolantes e conjecturas irracionais, do tipo “ será que não estão passando outros pacientes na frente dele?” “Será que não está havendo ‘direcionamento’ de atendimento para pacientes com melhores condições financeiras?”
O fato é que a cirurgia não sairia de novo. E agora, quando sairia? Para piorar, o Dr. Sílvio nos dá a notícia de que teria que se ausentar por no mínimo uma semana, pois teria que ministrar aulas em uma faculdade de São Paulo. Pôxa, mas então agora a cirurgia, se (e quando) saísse, não contaria com ele, o especialista em cirurgias hepáticas?
- Olha, Marco – me disse ele – o cirurgião que atende esta ala é um profissional experiente e pode realizar tranquilamente a cirurgia. Aliás, é um ótimo cirurgião...
- Mas, Dr Sílvio, - interrompi – não se trata disso, mas sim de participar da cirurgia alguém que é especialista, como o senhor. Não ficaremos seguros sem a sua presença. O Dr. Jorge já não estará presente...
- Entendo, mas infelizmente meu compromisso é inadiável.
Acabei entendendo e passei a informação para a família. Agora surgia um outro dilema: torcer para que a cirurgia saísse logo ou torcer para que não saísse, dando tempo para que o Dr. Sílvio retornasse da viagem?
A segunda opção nos parecia a mais sensata, mas havia o outro lado, o emocional. O pai começava a mostrar impaciência, dizendo-se cansado. Imagine-se uma situação dessas. Ficar deitado num leito de hospital, entre pessoas estranhas, vários e vários dias, mirando a janela desde o leito, sendo medicado periodicamente, comendo só “comida de hospital” e revendo os familiares apenas por alguns momentos duas vezes por dia... Devia ser torturante. E só por causa disso também não nos queixávamos dos transtornos que os adiamentos da cirurgia causavam a todos. Era complicado e sofrido para todos nós também. As viagens eram estafantes naquele mormacento Janeiro de 2006. E não é preciso esforço para compreender que quem passava os dias num albergue, por mais funcional que ele fosse, não estava agraciado com nenhuma vida de rei. Sem falar nos problemas que enfrentávamos em nossas empresas para conseguir “dias de folga” e nos deslocarmos à capital para acompanhar uma cirurgia que não saía.
A vida da família havia mudado de repente.
Vivíamos dias muito atribulados e angustiantes.
O horizonte que enxergávamos não era reluzente...

quarta-feira, 15 de julho de 2009

NO NATAL, ELE SE FOI...

PARTE XV



EXPECTATIVA FRUSTRADA





Por volta da 19 horas eu finalmente liguei para a mãe, que atendeu prontamente o celular. Estava esperando que alguém ligasse. Tudo certo. Já estava instalada no albergue e o pai já ocupava o leito na Santa Casa. Perguntei sobre as instalações do albergue, como funcionava tudo ali, se ela estava bem. Respondeu positivamente e pude sentir que estava realmente bem acomodada. Perguntei, então, sobre o pai. Disse que estava baixado, ocupando o leito que lhe haviam reservado e que estava bem. Já faziam os primeiros exames de sangue, visando prepará-lo para a cirurgia. Mas estava tranquilo e confiante. Agora todos estávamos. Havia passado aquela tensão da espera pelo leito que nunca ficava disponível e também nos tranquilizava um pouco o fato de a cirurgia estar mais próxima. Embora o prognóstico da doença dele não indicasse "urgência urgentíssima", ninguém ficaria tranquilo sabendo que um familiar padecia com um tumor no fígado. É claro que ansiávamos pela cirurgia e pelo tratamento posterior, que pudesse significar senão a cura definitiva ao menos uma longa sobrevida.

Enquanto eu aguardava que o Dr. Jorge ou o Dr. Sílvio me confirmassem quando seria realizada a cirurgia, vasculhei centenas de sites na internet, buscando informações sobre a doença. E cada texto que eu lia me deixava mais preocupado. Todos os prognósticos e estatísticas indicavam uma evolução muito ruim para pacientes como ele. A sobrevida média esperada para pacientes com tumor hepático localizado, sem metástase, era de 3 anos. Um tempo curtíssimo para quem sonhava em ver o pai envelhecer até 80 ou 90 anos com saúde. Na verdade, era desanimador tomar conhecimento disso. Então, buscando melhorar o astral, eu conversava com todos os médicos que conhecia. Liguei para dezenas de amigos, contando da situação e pedindo opiniões. Mas os médicos são muito cautelosos quando se trata de prognósticos. Evitam emitir opiniões que tragam desânimo, mas deixam também de emitir opiniões que causem expectativas exageradas. A maioria deles, no entanto, tentava ser o mais objetivo possível. E o que eu ouvia deles não era bom. A cura era possível, sim, mas o tamanho do tumor conspirava contra ela, pela grande possibilidade de retorno da lesão em alguns meses depois da cirurgia. Mas nem isso era capaz de me tirar a esperança. Mesmo sendo extremamente realista e pragmático, sempre deixo que o otimismo ocupe seu lugar em minha mente. Ouvi algumas histórias de pessoas que tiveram o mesmo problema e sobreviveram mais 10 ou 15 anos. Por que não poderia o pai ter essa sorte? E se ele sobrevivesse tempo suficiente para que um novo tratamento - células-tronco, por exemplo - passasse a ser usado com eficácia? Era preciso acreditar. E era essa idéia otimista que eu tentava passar para a família e para todos os amigos que ansiavam por notícias. O astral tinha que permanecer alto. Seria o melhor jeito de amenizar todo o sofrimento psicológico que experimentávamos naquele momento.

No dia seguinte obtive a confirmação de que a cirurgia seria realizada na Sexta-Feira daquela semana. O Dr. Jorge e o Dr. Sílvio participariam dela, juntamente com um médico paulista que viria especialmente para atuar com eles.

Ficamos eufóricos com a notícia. Liguei para meus irmãos e combinamos de estar lá para acompanhar. Não lembro se viajamos todos para Porto Alegre. Mas o fato é que liguei imediatamente para a Superintendência do Banco e informei que iria me ausentar para acompanhar a cirurgia do pai. A esta altura do campeonato, quase todos os colegas da Sureg Alto Uruguai sabiam do drama que eu estava vivendo. Muito mais os colegas do MBA que eu estava cursando desde a metade de 2005. Eu recebia ligações quase que diariamente pedindo informações sobre a saúde do Bernardo. Até de colegas com quem nem tinha tanta intimidade, mas que mostraram-se naquele momento extremamente solidários.

Viajei num daqueles ônibus da Unesul que fazem da viagem uma tortura, mas não temos muitas alternativas nesse canto do Estado. Cheguei na capital por volta das 5 horas da manhã. Tomei um taxi e fui direto ao albergue, onde encontrei a mãe já de pé. Abracei ela. Me convidou para tomar um café. Aí passei a entender um pouco do funcionamento daquele local. Havia um espaço amplo, onde ficavam cerca de 30 beliches. Ali ficavam alojados os homens. As sacolas e mochilas ficavam penduradas nas colunas das camas, no chão, ou debaixo das camas. O calor era intenso naqueles dias, mas havia ventiladores de teto. Num outro espaço menor, mais reservado, ficavam as mulheres. As duas áreas eram separadas por um salão onde havia várias mesas e uma ou duas geladeiras, uma pia, um fogão - tudo isso era compartilhado por todos os "hóspedes". Cada um preparava sua própria comida.

Por volta das 7:30 saía a primeira lotação levando doentes e familiares até os hospitais. Apressamo-nos para sair na primeira viagem. A cirurgia deveria sair a qualquer momento naquela manhã.
Lembro que chegamos à Santa Casa e a mãe nos conduziu até o andar onde ficava a ala em que o pai estava baixado. Como não era ainda hora de visita, não adiantou nada dizer ao segurança, na entrada da ala, que estávamos ali para acompanhar uma cirurgia. O negão parecia um armário. De verdade. No mínimo um metro de diâmetro. Mas até que foi educado e procurou se informar, nos garantindo que caso a cirurgia fosse acontecer, liberaria a nossa entrada. Tentávamos disfarçar a tensão fazendo piadas com o tamanho exagerado do porteiro, conversando, falando de notícias de Paim Filho para a mãe.
Finalmente, por volta das 9 horas, nossa entrada foi liberada e fomos direto à enfermaria onde estava o pai. Ele estava deitado de lado, virado para a porta. Naquele quarto havia mais 4 ou 5 leitos, todos ocupados. O pai nos recebeu com um largo sorriso. Acho que nos ver naquele momento deve ter sido extremamente agradável depois de toda a tensão que havia passado. Tinha um catéter enfiado no ombro, pronto para receber medicamento a qualquer momento. Já lhe haviam preparado para a cirurgia, mas até então, nada havia acontecido. Estranho, pois normalmente as cirurgias são realizadas justamente nas primeiras horas da manhã. Perguntamos se sabia de algo, mas repondeu que ninguém havia falado com ele, que apenas o haviam preparado, administrado medicamentos, alguns tranquilizantes, mas da cirurgia, nada.
De repente, olhamos para o corredor e vimos caminhando em nossa direção um grupo de médicos. Reconheci imediatamente o Dr. Jorge e o Dr. Sílvio, junto com um outro com cara de japonês. O Dr. Jorge balançava a cabeça negativamente, de modo que percebemos que algo não havia dado certo.
- Não vai sair a cirurgia hoje - disse o Dr. Jorge.
- Mas como? O que houve, Doutor? - perguntei aflito.
- Não há UTI disponível. No caso da cirurgia do teu pai, será preciso ter uma UTI disponível, pois haverá necessidade de cuidados especiais, pela perda de sangue, pela extensão da cirurgia. Sem UTI não dá...
E essa agora. Não estava nos planos. Não estava mesmo. Afinal, havíamos viajado por nada? Tudo bem que teríamos vindo da mesma forma para dar aquela força para o pai e para a mãe, mas poderíamos ter vindo no final de semana, sem perder um dia de trabalho.
- Mas, então, quando é que sai a cirurgia, Dr. Sílvio? - perguntamos com aflição.
- Sem previsão. Damos graças a Deus de ter conseguido o leito, mas agora precisamos garantir uma UTI. Normalmente as cirurgias são realizadas nas terças ou nas sextas-feiras. Talvez na próxima terça.
Entendemos. Se não havia outro jeito... Mas foi um balde de água fria. Uma expectativa frustrada. A continuação da ansiedade. O prolongamento do sofrimento físico e psicológico do pai, que agora teria que ficar confinado a uma cama de hospital, quem sabe por vários dias.
- Tudo bem,- resignou-se o Bernardo, que ainda brincou: - vou tirar umas férias e dormir bastante...
Apesar de tudo, foi bom vê-lo sorrindo. Conversamos muito. Procuramos lhe passar segurança. Aproveitamos todo o tempo disponível do horário de visita. Detalhe, havia menos de 3 dias que estava ali e já conhecia todos os companheiros de quarto - um rapaz com a perna fraturada, um senhor mais idoso com problemas renais...mas chamava a atenção o jovem da cama ao lado da dele. Um rapaz moreno, aparentando pouco mais de 30 anos, de nome Roberto. Tinha câncer de estômago e estava ali também para uma cirurgia. Notamos que eles conversavam bastante e isso devia ajudar a passar o tempo.
Terminou o horário de visita e nos chamaram. Nos despedimos com um beijo. Voltaríamos à tarde.
- Fique tranquilo, pai. Vai dar tudo certo! - passei a mão na sua cabeça meio suada.
- Eu estou tranquilo, filho. Deixei tudo nas mãos de Deus.
Descemos até o pátio da Santa Casa e fomos até o local onde estacionavam as ambulâncias que vem do interior diariamente. Não tardou e chegou o motorista da "nossa" lotação. Retornamos ao albergue. Estávamos frustrados. Realmente não havia passado pela nossa cabeça que depois de esperar tanto tempo por um leito dependeríamos ainda da disponibilidade de uma UTI. Em momento algum alguém nos havia mencionado essa possibilidade. Tenho quase certeza que nem os médicos esperavam por isso.

domingo, 5 de julho de 2009

NO NATAL, ELE SE FOI...

PARTE XIV

A viagem


Passada a emoção pela conquista do leito na Santa Casa, era urgente que se conseguisse o meio de transporte para chegar em Porto Alegre dentro do prazo. Seria preciso sair de Paim Filho no máximo ao meio-dia, pois para uma viagem tranquila são necessárias entre 5 e 6 horas, conforme o trânsito que se encontra pelo caminho. Então, era urgentíssimo que nos mobilizássemos. O pai e a mãe já estavam preparados há dias. Deveria ser rápido colocar os pertences na mala. Dias antes a mãe havia conversado com o tio Negro (Rodolfo, seu irmão), que havia intermediado a hospedagem dela no alojamento de um albergue mantido por um deputado, na capital. Sabíamos que havia algumas alternativas diferentes, mas a opção pelo albergue nos pareceu a melhor naquele momento, já que a hospedagem era gratuita e os gastos seriam somente com os mantimentos. Além disso, o próprio albergue mantinha um serviço de transporte, conduzindo os familiares até hospitais e clínicas em horários pre-determinados ou sempre que necessário. Ou seja, vinha bem a calhar para a nossa necessidade, além de nos dar uma certa sensação de autonomia. E aqui fica uma observação importante: jamais concordei com as pessoas e parte da imprensa que começaram a bater forte nos deputados que mantém albergues (e são vários, de vários partidos políticos), alegando fins eleitoreiros. Primeiro porque acho que apenas estão viabilizando algo que deveria ser proporcionado pelo Estado e não o é. Segundo, porque vi de perto todo o bem que esses albergues fazem a toda a população que os procura, principalmente aos mais carentes. E, terceiro, porque ficamos cerca de 1 mês no albergue e jamais alguém sequer tocou em assunto de política conosco. Não sou ingênuo prá imaginar que os deputados não tenham algum objetivo nesse sentido quando gastam boas somas em dinheiro para manter albergues em funcionamento, que tem um fluxo contínuo de pessoas, que são potenciais eleitores. Mas não vejo nada de errado nisso. Os que criticam deveriam fazer o mesmo. Haveria muito mais vagas disponíveis. Ponto.
Voltando ao dia da viagem.
Já passava das 10 horas da manhã e nada de conseguirmos o carro. Uma das ambulâncias de Paim estava em Passo Fundo. A outra estava com problemas. De modo que não havia condições de se aguardar por esse meio. Liguei para Cacique Doble, onde tenho muitos amigos, inclusive da administração municipal e pedi socorro, mesmo sabendo que éramos de outro município . Colocaram-se à disposição para ceder a ambulância, mas não naquele horário, já que também estava em Passo Fundo. Já muito aflito, peguei o carro e fui atrás do secretário da saúde de São José do Ouro, também meu amigo, e quase implorei para que me ajudasse. Mas, incrivelmente, a ambulância estava em...Passo Fundo. Aí a adrenalina subiu de novo. Começa a bater aquela sensação de impotência, de insegurança, de desespero, até. Será que depois de tanto tempo à espera de um leito, justo no dia em que se consegue não teríamos transporte disponível? Lembro de ter ligado pro pai e encontrado ele muito nervoso. Recebi até um xingão pelo telefone, coisa que era muito rara de parte dele. Estava com os nervos à flor da pele, era visível.
Então, não houve alternativa. Já eram quase 11 horas da manhã quando eu desisti de contar com "ajuda externa". Raciocinei que ele não estava num estado que necessitasse de uma ambulância para ser transportado, longe disso. Um carro simples bastava. E isso eu tinha. Liguei prá Neu e disse "Neu, não tem jeito, acho que vou emprestar o nosso carro mesmo prá eles irem a Porto Alegre, o que você acha?" Como sempre, ela concordou prontamente. "É o teu pai" - disse ela.- "faça o que achar que tem que ser feito, não precisa perguntar nada prá mim sobre isso..."
Liguei então prá farmácia e falei com eles. "Arrumem um motorista, que eu estou saindo agora daqui. Vocês vão no meu carro."
Ao meio-dia, eu estacionei em frente à farmácia. O motorista seria o seu Rocha, ex-cabo da Brigada Militar e nosso amigo, que conhecia bem o trajeto e os endereços em Porto Alegre.
Carregamos o porta-malas. Nos abraçamos, nos beijamos. Desejamos boa sorte ao pai e à mãe. Passava pouco do meio-dia. Chegariam a tempo, com certeza. Se não me engano, o Nando emprestou seu celular prá mãe, a fim de termos um canal de comunicação. E partiram. Fiquei olhando aquele carro dobrar a esquina. Acho que meus olhos acompanharam cada volta dos pneus, como se a cena se desenrolasse em câmera lenta. Não havia uma música ao fundo, mas se houvesse, com certeza tudo lembraria uma cena de novela ou de cinema. E na garganta da gente ficou um nó. Poucas vezes durante toda a minha vida eu havia me despedido dos meus pais de maneira semelhante. Dessa vez tudo pareceu diferente. Pairava mesmo no ar uma sensação estranha.
Assim que o carro sumiu de nossa vista, ainda conversamos um pouco na frente da farmácia. Acho que combinamos alguma coisa, nem lembro o que, com a Jussane. E em seguida entrei no fusquinha vermelho do pai e rumei para São José de novo. Me dei conta de que ainda não havia almoçado. Mas não tinha fome. Fui direto para o Banco, tentar retormar a rotina. Ao final da tarde, finalmente eu ligaria para a mãe, e saberia se dera tudo certo. Ao final da tarde.