terça-feira, 9 de junho de 2009

NO NATAL, ELE SE FOI...

PARTE XI

AINDA EM PORTO ALEGRE

Ouvimos atentamente as instruções do Dr. Sílvio. Sentimos nele um certo otimismo. Nos passou segurança quando falou que a cirurgia tendia a ser curativa. Ele, de fato, parecia acreditar que era possível obter a cura do tumor, embora o diâmetro surpreendente de 8cm me deixasse um pouco cético. Parecia inconcebível tirar um pedaço tão grande de um órgão vital e vê-lo regenerar-se a ponto de retornar ao tamanho normal, devolvendo ao pai as suas funções hepáticas sem que restassem sequelas. Mas a impressão era de que estávamos diante de um profissional experiente, com conhecimento de causa. E estávamos.
Uma linha da Unesul saía às 12:15 de Porto Alegre e chegava às 19 horas em São José do Ouro. Depois disso, só conseguiríamos retornar com um ônibus das 19:15 - aquele pinga-pinga que passa por Nova Prata e André da Rocha e deixa a gente parecendo que retornou de uma guerra... E chegaríamos de madrugada. Terrível.
Nos aproximávamos das 11:00 quando o Dr. Sílvio decidiu que seria necessário um outro ultrassom. Era preciso um ultrassom com doppler, com o objetivo de identificar claramente se não havia nenhum outro foco tumoral no fígado do pai. Tudo indicava que não. Mas era necessário, a fim de nortear o procedimento cirúrgico de forma a não deixar possibilidade de recidiva (o retorno do tumor).
Fomos rápidos em decidir onde fazer. O médico nos deu algumas alternativas, mas optei pela que achei mais prática. Liguei para a Marília e perguntei se ela poderia intermediar rapidamente a realizaçao de um exame assim, de modo que pegássemos um táxi e em poucos minutos estivéssemos realizando o procedimento. Eu acreditava que seria possível em pouco mais de uma hora estarmos liberados para retornar com o ônibus do meio-dia. E já fomos conversando sobre plano de saúde, SUS, etc. Acabou que entendemos que não haveria outra solução a não ser realizar o exame pagando "particular". Tudo bem. Eu estava preparado para gastos extras. Mesmo assim, a Marília conseguiu um grande desconto para nós. Acho que nos cobraram apenas os custos do exame. Na pressa, nem lembro por que, acho que justamente pela necessidade de corrermos para a rodoviária, acabamos nem pagando a despesa. A Marília disse que acertava por nós e depois me ligaria para que eu depositasse o valor na conta dela. Foi ótimo. Ganhamos um tempo precioso. O pai entrou na sala do exame e eu fui com ele. Uma médica ou enfermeira extremamente simpática e atenciosa nos atendeu. Foi fazendo o exame e nos explicado em detalhes tudo o que fazia. Conversava com o pai com uma calma relaxante e o deixava cada vez mais tranquilo. Identificou a localização do tumor e nos disse que o restante do fígado estava "quase" perfeito. Na hora não entendemos muito bem o que significava aquele "quase". O pai nunca soube. Eu viria a saber depois, que havia um outro nódulo em formação, próximo do principal. Era a má notícia. Significava que o tumor principal tinha potencial para formação de outros nódulos. Seria um grande desafio para o Dr. Sílvio realizar uma cirurgia que não deixasse resquícios do tumor no tecido hepático do pai.
Na saída, tive que puxar o pai pelo braço. Ele não parava de agradecer à médica pelo tratamento cordial e respeitoso que teve com ele. O pai era assim. Querendo agradá-lo, era só tratá-lo bem. Simplicidade, simpatia, humildade. Eram suas palavras mágicas.
Corremos para o pátio do Clínicas e entramos rapidamente em um táxi. Olhei para o relógio: 12:05. E ainda tinha que chegar e comprar a passagem. Fiz o taxista acelerar tudo o que podia. Parecia que estávamos numa perseguição policial. Por sorte deu tudo certo. Não ficamos presos em nenhum sinal e acabamos chegando em tempo. Comprei as passagens num relâmpago. E mais uma vez peguei o pai pelo braço e o fiz correr. "The Flash" passaria vergonha naquele dia, de tanto que corremos. Quando chegamos ao box da Unesul, o motorista se preparava para entrar no ônibus e fechar a porta...que sufoco. Mas em minutos estávamos ali, acomodados. O pai recostou-se no confortável banco do pinga-pinga e inciou um delicioso cochilo. Eu? Nem sei, porque apaguei de vez. Fui acordar em Caxias, na primeira parada. Por sinal a primeira de muitas que viriam. O cobrador anunciou que seriam 15 minutos. Capaz que eu acreditaria nisso. Nessas linhas da Unesul o tempo segue a lógica de Einstein. É relativo. 15 minutos sempre significam meia-hora.
Só então me dei conta de que estávamos sem comer desde o café da manhã.
E então, às 14 horas daquele fatídico dia, desci triunfante as escadas do ônibus, fui ao bar da rodoviária que fica bem em frente ao box e comprei. Sim, comprei dois belíssimos...pastéis. De carne com azeitona, óbviamente. Eu e o pai nos deliciamos com aquela iguaria, enquanto saboreávamos uma coca-cola geladinha. Foi um fantástico almoço. Podem acreditar.

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