terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

NO NATAL, ELE SE FOI...

PARTE XXX

UM INIMIGO FEROZ...


Se, por um lado, constatar que não havia ocorrido a temida "trombose da veia-porta" significava algum alento, por outro era preciso descobrir com urgência o motivo de o fígado dele ter praticamente parado de funcionar. Uma pista me fora deixada pelo Dr. Sílvio e se revelaria correta logo no início da tarde. A bateria de exames de sangue e urina confirmaram uma violenta infecção do líquido abdominal por algum microorganismo ainda não identificado. Uma infecção hospitalar. A situação era gravíssima. A segunda complicação mais temida pelos médicos nos períodos de recuperação de transplantados ou pacientes de ressecção hepática é a infecção abdominal. Não raro ela evolui para septicemia e leva ao óbito de pacientes com potencial para recuperação. Era preciso entrar imediatamente com um antibiótico potente para tentar reverter o quadro. E assim foi feito.
Enquanto a luta começava a se desencadear no organismo do pai, contra um inimigo potencialmente mortal, as funções hepáticas começaram a voltar aos níveis anteriores e logo no dia seguinte já mostravam boa recuperação. Conforme o antibiótico agia contra o microorganismo que lhe infectara as entranhas, dava uma "folga" para que a lenta recuperação do órgão seccionado tivesse prosseguimento. Mas o tempo se esgotava. 10 dias era o prazo que o Dr. Sílvio havia fixado para que se tivesse alguma esperança de "virar o jogo". No livro de estatísticas do médico, só lhe restavam cerca de 10% de chances de recuperação. Passado esse período, apontam os registros que praticamente 100% dos pacientes submetidos a esse tratamento não conseguem mais recuperar-se e caminham para o óbito.
O dia seguinte, na nossa cabeça, era o dia "D", portanto. Era o décimo dia. O último em que iríamos para o hospital com alguma esperança. Se o exame diário de sangue não demonstrasse nenhuma reação do fígado, permanecendo naqueles índices de 29 ou 30% seria hora de pensar no funeral. Era visível no semblante dos médicos o desânimo quanto ao prognóstico. A cada tentativa que fazíamos de obter uma informação, qualquer que fosse, que nos desse algum alento, só ouvíamos evasivas e coisas do tipo "tem que ter paciência, é assim mesmo..." ou "é difícil falar alguma coisa, mas o caso dele continua gravíssimo, vocês têm que se preparar para o pior..." Ou seja: ninguém mais acreditava na recuperação do pai, além de nós, que teimávamos em manter a esperança. Além de nós e de uma enfermeira que estava por ali e ouvira algumas de nossas conversas com os médicos. Quando ficamos sozinhos ao lado do leito do pai, ouvimos dela, surpreendentemente: "Não dêem bola para o que os médicos falam. Acreditem na recuperação dele. Em todos esses anos tenho visto centenas de pacientes desenganados que viveram muitos e muitos anos e viram seu próprio médico morrer antes deles..." Surpreendente por tal afirmação partir de uma enfermeira. Era algo que estávamos acostumados a ouvir. De leigos. Não de profissionais médicos. E isso só serviu para reforçar ainda mais nossa esperança.
Mas o próximo dia era decisivo. Era o 10° dia!

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