sábado, 19 de setembro de 2009

NO NATAL, ELE SE FOI...

parte XX


A CIRURGIA...E A SURPRESA DESAGRADÁVEL
Desnecessário discorrer sobre a tensão que antecedeu aquela Segunda-Feira. Nem lembro o que fizemos no dia 22 de Janeiro de 2006. Acho que almoçamos em São José do Ouro, com o celular funcionando direto, em contato com o Nando.
Na Segunda, de manhã, tive que ir trabalhar normalmente.
Imagine um gerente de Banco tendo que atender a seus clientes, dar andamento a pendências de crédito, responder às naturais cobranças pelo atingimento das metas e tendo seu cérebro martelado a todo momento pela angústia de esperar por notícias da cirurgia em andamento num hospital em Porto Alegre. Foram momentos complicados, tensos, extremamente estressantes.
Liguei várias vezes durante aquela manhã, mas as notícias que o Nando me passava eram simplesmente de que o pai estava em cirurgia e não havia previsão para o término dos procedimentos. Inicialmente havia uma expectativa de que a cirurgia durasse cerca de 8 horas, pela sua complexidade. O fígado é um órgão difícil de ser “trabalhado”. Passa por ele todo o sangue do organismo, num incessante trabalho de filtragem, que permite o funcionamento de todos os demais órgãos. Natural, portanto, que todas as precauções sejam tomadas no que tange à perda de sangue. E são evidentes os riscos de uma hemorragia incontrolável, fatal. Era uma cirurgia de risco, sem sombra de dúvida. Mas o Dr. Sílvio havia nos tranqüilizado. Era no hospital Moinhos de Vento que estava o único aparelho do Estado especial para cirurgias hepáticas, que permitia um controle muito preciso da inevitável perda de sangue.
As horas não passavam. Eu ligava a cada meia-hora para o Nando ansiando por novidades que não vinham. A Neu me ligava, ligavam as filhas, ligavam amigos, parentes, colegas de Banco. Aquele foi, definitivamente, um dia incomum na minha vida.
Às 17:30 horas, já em casa, recebi um telefonema do Nando.
- O pai saiu da cirurgia. Foi tudo bem. Só que o médico mencionou algum outro problema, que não sei explicar. Ligue pro Dr. Sílvio!
Que problema poderia ser? Bem, o que importava no momento é que o pai estava vivo e correra tudo bem na cirurgia. Uma sensação de alívio me levou a um suspiro profundo, enquanto a Neu, do meu lado, me abraçava com os olhos marejados. Ela tinha consciência do que representaria para mim o sucesso nessa cirurgia. Havia acompanhado todo o meu sofrimento nos dias que antecederam ao evento e sabia muito bem o porquê de eu ter perdido mais de 10 quilos nos últimos 60 dias. Ela tinha muito presente que eu me sentia responsável pela vida do pai naqueles momentos. E sabia, com certeza, o que representava para mim saber que tudo dera certo, que o pai poderia iniciar uma recuperação e, quem sabe, retomar sua rotina em poucos dias, livre de uma doença maligna.
Mas não seria assim.
Infelizmente, o destino nos reservava outra surpresa desagradável, que a princípio não compreendemos muito bem, mas que mais tarde revelaria toda sua importância no desfecho da vida do nosso pai.
Refeito da emoção, liguei para o Dr. Sílvio.
- E então, Dr Sílvio, sucesso na cirurgia?
- Felizmente sim, Marco. – respondeu - Tudo transcorreu melhor do que o esperado. A perda de sangue foi mínima e ele já se recupera na CTI. Porém...
(havia um porém)
-... tivemos uma surpresa ao iniciarmos a incisão no fígado dele...- continuou.
- Como assim, Dr. Sílvio? – questionei aflito.
- Olha, às vezes não há como detectar algumas situações. Nenhum exame prévio demonstrou isso, nem mesmo as tomografias realizadas...mas o teu pai apresentava o que chamamos de “cirrose micronodular”.
- Certo, mas o que isso significa, Dr. Sílvio?
- Significa, Marco, que teu pai apresentou um fígado cirrótico, não normal. Por pouco não desistimos da cirurgia, porque há algumas implicações nessa situação nova.
A esta altura minhas pernas já começavam a tremer, como da vez em que o Dr. Paulo Cavazzola confirmara a malignidade do tumor no fígado do pai.
O Dr. Sílvio continuou:
- Ocorre o seguinte: mesmo sendo uma cirrose incipiente, inicial, é bem provável que venha a atrapalhar a regeneração do fígado dele, que pode ficar bem abaixo do esperado.Agora é torcer para uma evolução boa nesse sentido, para que ele não venha a desenvolver uma insuficiência hepática. As chances de sobrevida, eu diria, diminuem uns 20% neste caso. Antes dessa situação, ele tinha 100% de chances de sobreviver e excelentes chances de não vir a desenvolver novos nódulos, ao menos num curto espaço de tempo. Seria uma cirurgia quase curativa. Agora, ficará uma incógnita.
- Mas, Dr Sílvio, - interrompi – ainda assim o Sr. nos dá uma probabilidade de 80%...
- Claro, Marco, o fígado é um órgão fantástico, com um poder de recuperação muito grande. No entanto, depende do nível de “agressão” ao tecido hepático. Tudo vai depender de o fígado dele reagir e iniciar uma regeneração...
- Há risco de não regenerar, Dr?
- Há. Infelizmente, há. A cirrose pode impedir a regeneração. Nesse caso, ele não sobreviveria, pois ficou com apenas 40% do órgão. Insuficiente para mantê-lo vivo. Mas não vamos nos precipitar. Ele foi levado para a CTI, está evoluindo normalmente. Os próximos dias serão decisivos. Quanto mais cedo notarmos uma reação da função hepática, maiores as chances de que ele se recupere bem. Eu diria o seguinte: de agora em diante, cada dia que passar sem que o fígado reaja positivamente, as chances de sobrevida dele diminuirão (estatisticamente) cerca de 10%...
Entendi. O pai corria risco. Essa era a realidade. A cirrose “escondida” pelos exames prévios poderia vir a ser a causa de uma possível não sobrevivência dele. A exposição da realidade “nua e crua” por parte do Dr. Sílvio tinha o claro objetivo de nos preparar para um inesperado desfecho, já que ele observara toda a esperança da família na recuperação do pai. Como médico, acreditava na recuperação dele, mas tinha obrigação de passar a algum familiar a realidade da situação. Obviamente, eu fora o escolhido, já que havia conduzido todo o processo até então. Novamente era eu o “paredão”- aquele que deveria receber e absorver todo o impacto da desagradável realidade, para depois, com serenidade, repassar aos familiares e amigos.
Minha missão estava longe de terminar.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

NO NATAL, ELE SE FOI...

PARTE XIX

RUMO AO HOSPITAL MOINHOS DE VENTO...

No Sábado, como previsto, fomos todos à Santa Casa. Conversamos com o pai, que àquela altura já não esboçava a menor reação quanto ao que havíamos decidido. Era o cansaço físico e o sofrimento psicológico que falavam mais alto. Ele sabia de todos os nossos esforços em vão tentando fazer com que a cirurgia fosse realizada. Sabia de todos os contatos com deputados, secretários, políticos, médicos. Sabia da legião de amigos e colegas de Banco que me ligavam diariamente indignados com a situação. Sabia também que seus amigos já compartilhavam de sua angústia pela demora no início do tratamento. E, principalmente, sabia que sua doença era grave e avançava, mesmo que lentamente, como informavam os médicos. Era impossível esperar mais tempo.
Lembro que quando procuramos o chefe do setor e informamos da decisão de pedir a alta do pai sob nossa responsabilidade, ouvimos dele que estávamos “botando os pés pelas mãos”, insinuando que fazíamos a coisa errada. Discordamos dele. Talvez a “coisa errada” tivesse sido a de confiar que seríamos beneficiados pelo SUS. Ignorar tudo o que se fala a respeito da saúde no Brasil, achando que os problemas só acontecem “com os outros”. Achar que conosco seria diferente. Essa foi a “coisa errada” que fizemos: tentar beneficiar-se de um direito que deveria ser sagrado para todos os contribuintes que recolhem fortunas em impostos durante uma vida inteira e depois penam para conseguir um leito no hospital no primeiro problema grave de saúde que enfrentam. Sim, erramos feio ao incentivar o pai a pagar quase um salário mínimo por mês para um plano de saúde regional da UNIMED durante mais de dez anos e achar que quando nossos pais precisassem dele seriam prontamente beneficiados. Mas agora não. Agora era a mais acertada de todas as decisões. Por mais que nos tentassem explicar a razão de tanta demora, por mais que tentassem expor a situação da Santa Casa e suas normas internas de funcionamento, soava incompreensível deixar um paciente grave deitado em um leito por mais de 20 dias à espera de uma cirurgia, passando quase que diariamente pelos preparativos, recebendo inclusive a medicação necessária, sem que a mesma se concretizasse. Agora, já entendíamos ser uma questão de respeito com os próprios sentimentos do pai e da família. Era mesmo decisão tomada. Assim, assinamos todos os documentos, autorizações, declarações e “o escambau” que nos apresentaram e, sob nossa responsabilidade, tiramos o pai daquele hospital. As enfermeiras finalmente arrancaram-lhe o cateter que mantinham a 20 dias grudado em seu pescoço, além da agulha encravada em seu antebraço e despediram-se dele, desejando-nos melhor sorte na nova investida que faríamos, no Moinhos de Vento. O mesmo fizeram os responsáveis por aquela ala quando nos despedimos. Creio que até eles entenderam o que fazíamos. Quando me despedi do chefe do setor, pedi desculpas educadamente e ouvi dele um “não tem do que se desculpar, amigo, pois talvez eu estivesse tomando a mesma atitude se fosse meu pai...” E fiquei feliz ao ouvir isso, porque outra vez tive certeza de que a decisão era correta.
Apesar de tudo, nenhuma mágoa da Santa Casa.
Enquanto pai esteve lá, foi tratado da melhor maneira possível. Sempre brincalhão, o pai agradava as enfermeiras, e elas gostavam dele como paciente. Nunca reclamava, aceitava serenamente todos os procedimentos, submetia-se resignado a tudo o que fosse necessário. A verdade é que fomos muito bem tratados por todos e nada restou a reclamar senão da demora na realização da cirurgia. E mesmo assim temos consciência de que apenas estávamos sendo mais uma vítima de um sistema de saúde pública ineficiente no país em que mais se arrecada impostos no planeta. Não era culpa da Santa Casa, nem de seu corpo clínico. De qualquer modo, a experiência serviu para que víssemos mais de perto o que acontece com a saúde dos que, sem recursos, apelam para a saúde pública. Sem dúvida, saímos de lá mais conscientes disso.
E saímos contentes do hospital. O pai exibia um discreto sorriso e passava-nos a sensação de estar aliviado, mesmo com tudo o que estava acontecendo com ele. Visivelmente não estava confortável na Santa Casa. Não pelo atendimento, repito, mas pela demora.
Nos dirigimos até o albergue. A mãe preparou um almoço simples. Nem lembro o que comemos. Mas depois de quase um mês voltamos a almoçar todos juntos. E conversamos, e rimos, e fizemos piada de algumas situações vivenciadas até então. Por um momento pareceu que não estávamos ali por motivo de doença, mas sim para um almoço em família. Num albergue em Porto Alegre. Mas ainda um almoço em família.
Tenho fotos do pai naquele dia, no meu celular. De repente ele pareceu voltar ao normal. Alegre, conversou bastante, brincou, sorriu. Seu rosto ainda cheio e de aspecto jovial nem de longe lembrava aquele moribundo que ficara deitado num leito da Santa Casa durante mais de 20 dias. Que saudade daquele dia. Foi a última vez que o vi daquele jeito. Depois da cirurgia, veremos adiante, seu aspecto mudaria para sempre.
Viajamos todos de volta pra casa naquele sábado, com a sensação de dever cumprido. Só o Nando e a mãe ficariam em Porto Alegre. Eram eles que acompanhariam o pai no hospital. Quanto a nós, aguardaríamos o desfecho do procedimento cirúrgico e viajaríamos a Porto Alegre novamente no dia seguinte. Acompanharíamos tudo à distância, torcendo pelo sucesso do tratamento. O Nando acabaria sendo nosso interlocutor. E assim foi.

sábado, 5 de setembro de 2009

RETORNANDO...


CONFORME PREVISTO...

QUASE 10 DIAS ESPERANDO PELA INSTALAÇÃO DE INTERNET NA NOVA RESIDÊNCIA!

AGORA SOMOS TAPEJARENSES (AO MENOS POR ALGUM TEMPO, ATÉ UMA NOVA TRANSFERÊNCIA...)

MAS FINALMENTE ESTAMOS RETORNANDO.

AGUARDEM!