sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

NO NATAL, ELE SE FOI...

PARTE XLVII




VIDA NORMAL DEPOIS DO HOSPITAL


O pai teve alta no dia seguinte. Já se sentia melhor, alimentou-se, recobrou as forças. Na saída de Erexim pediu para parar em uma banca de frutas. Queria pêssegos, fruta que gostava muito. Comprei uns quilos.

Chegamos em Paim por volta do meio-dia e a mãe o recebeu com um abraço. Rejeitei o convite prá almoçar, pois não via hora de chegar em São José do Ouro, rever a Neu e as meninas e descansar, recuperar o sono perdido na noite anterior.

Os dias que se seguiram foram de observação. Eu mantinha (tenho até hoje) todos os resultados dos exames que o pai fazia. Acompanhava atentamente a evolução dos índices que nos diziam da atividade do seu fígado. Ao longo de todo o período de sua doença, devo ter aprendido tanto sobre o sistema hepático que poderia escrever um tratado sobre o assunto. Cada exame era por mim analisado minuciosamente e depois remetido por e-mail ao Dr. Sílvio, que de Porto Alegre me dava seu parecer. Ele evoluía bem. Conforme o fígado se recompunha, os índices melhoravam. As principais enzimas produzidas pelo órgão evidenciavam a gradativa melhora, o que nos enchia de esperança, mesmo que agora tivéssemos que conviver com os novos nódulos que haviam surgido.

Claro que também o pai começava a nutrir uma expectativa mais positiva sobre o seu caso. Ao sentir-se melhor, pode retomar parte de sua rotina. Voltou a atender clientes na farmácia, ia diariamente ao Clube para jogar baralho com os amigos, freqüentava a missa. Até o seu fusquinha ele tentou dirigir, mas a pouca força não lhe permitia mais.

A mãe, por sua vez, parecia não entender que a doença o deixara assim tão debilitado e de certa forma passou a exigir que ele se comportasse como estivesse curado. O tratava assim. Talvez fosse o desejo profundo de ignorar a tragédia pessoal, criando em seu subconsciente um mundo novo, onde nada daquilo tivesse acontecido, como se tudo não tivesse mesmo passado de pesadelo,agora terminado. Cuidava muito bem dele, não se tenha dúvida. Não saia do seu lado, alimentava-o (até demais), prescrevia-lhe a medicação, cuidava de sua aparência. Mas exigia, ao mesmo tempo, que se comportasse como uma pessoa normal, o que evidentemente ele não mais conseguia. Mas talvez esse comportamento da mãe fosse exatamente uma forma de fugir daquela realidade cruel que se abatera sobre um casal que convivia há quase 50 anos cuidando-se mutuamente,dividindo alegrias e tristezas e cuja continuidade agora estava seriamente ameaçada por uma doença que se mostrava potencialmente fatal.

Durante cerca de 60 dias as coisas andaram bem. Deu até para eles viajarem para Bento Gonçalves e ficarem alguns dias visitando a Mili e o Digo.

Na volta da viagem, porém, era hora de voltarmos ao Hospital de Caridade e verificarmos o resultado da primeira alcoolização.

Os exames preliminares de sangue, antes de qualquer procedimento, apontaram uma elevação da concentração de “alfafetoproteína”. Significava que o câncer ainda estava ativo. Os nódulos teriam que ser novamente tratados. Vinha aí outra internação e a repetição do procedimento.















quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

INESQUECÍVEL !!!

23/12/2008  -   23/12/2010
DOIS ANOS DE SAUDADES...

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

NO NATAL, ELE SE FOI...

PARTE XLVI




O SUCESSO DO PRIMEIRO PROCEDIMENTO




           O meu curso em Passo fundo caminhava para o final e já havíamos marcado a formatura para o final do ano. É claro que eu sonhava com a possibilidade de contar com a mãe e o pai na janta de formatura, mas sabia que seria muito difícil. E isso ficou ainda mais evidente quando a maca saiu da radiologia com o pai sobre ela em direção ao quarto, no primeiro piso do Hospital de Caridade. Ele estava acordado,porém sonolento. Aguardei que o colocassem na cama e depois me aproximei, tentando conversar com ele. Perguntei como estava, se havia sentido alguma dor, se precisava de algo. Balbuciou alguma coisa que não entendi direito e fechou os olhos, demonstrando estar fraco e debilitado. Deixei que dormisse. Conversaríamos depois. Enquanto isso eu precisava conversar com o Dr. Paulo e saber como fora o procedimento. Por sorte, encontrei ele ainda no hospital. Me explicou em detalhes como tudo havia sido feito. Por sorte o fígado do pai não era do tipo que sangrava com facilidade e dessa forma o principal temor do radiologista estava afastado. Com relação ao procedimento em si, tudo correra normalmente, com cerca de 10ml de álcool instilados em cada um dos nódulos. Não se usou de anestesia. Haviam dado para o pai um medicamento relaxante, de modo que a agulha lhe penetrara as entranhas com risco de que viesse a sentir muita dor. Mas não. Pelo jeito ele nada sentira no procedimento, já que, segundo o Dr. Paulo, teria ficado absolutamente tranqüilo durante todo o tempo. Agora era aguardar. Era preciso que ficasse imóvel e não levantasse da cama naquela noite, para que o movimento não induzisse a algum sangramento interno, que certamente se constituiria em uma situação de gravidade. Afora isso, só aguardar que recuperasse as forças. Voltaríamos para casa e retornaríamos em 60 dias, quando uma nova tomografia seria feita, a fim de verificar se o tratamento dera resultado. Seria essa nossa rotina a partir de então.

Por volta das 21 horas ele acordou. Eu já havia comido alguma coisa (sem dúvida, um pastel) na lanchonete do hospital e estava ao seu lado, lendo uma revista.

Conversamos, enfim.

- Como está se sentindo, pai?

- Bem -(a resposta de sempre) – só um pouco fraco...

- Alguma dor ?

- Nada. Não senti praticamente nada no procedimento, nem estou sentindo agora. Só estou me sentindo fraco...

“Que bom”, pensei, “pelo menos isso”. Já era um alento saber que ao menos não haveria muito sofrimento físico no tratamento.

Aproveitei e liguei para a mãe e para o Nando, que estavam ansiosos por notícias dele. Expliquei que tudo havia acontecido conforme o esperado. Passei-lhes as informações do Dr. Paulo e disse que estava mais tranqüilo. E esperançoso de que o tratamento funcionasse. Se assim fosse, talvez a sobrevida dele fosse maior que o esperado. Quem sabe? Senti que os dois ficaram também aliviados com a notícia.

Logo depois, percebi que o pai precisava descansar mais. Já passava de 22 horas. No quarto não havia outra cama. Só tinha uma cadeira de balanço, parecida com a da minha vó, com duas almofadas grandes. Era ali que eu deveria dormir naquela noite. E enquanto o pai caía novamente no sono, fiquei assistindo TV por mais umas duas horas. Era difícil dormir naquela cadeira. Eu não conseguia ajeitar meu corpo e recostar minha cabeça, de modo que o sono parecia impossível. Além disso, o entra-e-sai da enfermeira da noite não permitiria que eu dormisse, ao menos aquele sono profundo e reparador que seria necessário para estar em condições de dirigir de volta prá casa no dia seguinte.

Decidi então que iria dormir no carro, que estava no pátio do hospital, na parte de baixo, próxima ao parque.

Nem precisa dizer que o banco traseiro do Corsa era infinitamente mais confortável que a tal cadeira de balanço. Assim, num sono recortado por sobressaltos, passei aquela madrugada quente encolhido no pequeno espaço disponível, mas aliviado depois de ver que a primeira etapa do tratamento do pai havia sido cumprida.