PARTE XLII
O TRATAMENTO: O OUTRO CALVÁRIO
No sábado, após o término do meu curso, viajei de Passo Fundo a Erexim para buscar o pai e o Nando, que estava com ele. Ele estava bem. Mas era preciso iniciar o tratamento como forma de tentar eliminar os dois nódulos que haviam aparecido no que restava do seu fígado.
Numa conversa reservada com o Dr. Paulo, ouvi dele que o tratamento mais viável seria o que se chama de “alcoolização” dos nódulos. O procedimento consiste em se introduzir uma agulha comprida no abdômen, guiada por ultrassom, penetrando o fígado e atingindo diretamente cada um dos nódulos. Dentro do nódulo seriam instilados de 3 a 10 ml de um tipo de álcool especial (100%), que teria o poder de eliminar as células cancerosas. Era o que se poderia fazer no momento. Havia outras alternativas, como uma tal de “embolização” que consistia em injetar um tipo de espuma sintética diretamente nas artérias que alimentam os tumores, o que interromperia o fluxo de sangue, levando à deterioração do tumor. Mas isso só se fazia em Porto Alegre e era necessário o preenchimento de alguns requisitos que o pai não reunia no momento. Ficaria como uma “carta na manga”, para o caso de ele não responder bem ao tratamento com alcoolização. A boa notícia é que os nódulos poderiam ser controlados indefinidamente. Com um pouco de sorte, poderia ser possível eliminá-los com esse procedimento. A má notícia é que se tratava de um simples “paliativo”. A alcoolização é um procedimento que se usa para controle dos nódulos nos pacientes que aguardam por um transplante. Toda vez que o álcool fosse injetado nos nódulos, além das células tumorais, acabariam atingidas também células sadias, que aos poucos iriam diminuindo ainda mais a capacidade de filtragem do fígado, até um ponto em que não mais seria suficiente para mantê-lo vivo.
Obviamente não passei tudo isso para o pai. Ao contrário, mesmo abatido ao saber que praticamente não havia como curá-lo, senão apenas estender indefinidamente sua sobrevida, procurei elevar o seu astral, passando a impressão de que o tratamento seria suficiente para estender por muitos anos as sua vida, mesmo que debilitada. Deixei que imaginasse ser a sua salvação, não me importando se depois tivesse que informar-lhe que não seria um único procedimento, que seria o início de muitas viagens a Erexim a partir de então . E aí ele esboçou um sorriso, como se fosse o que queria ouvir naquele momento. Antes de tudo, ele amava a vida. Amava a família, sua cidade, seus amigos. O que ele desejava era mesmo estender o quanto fosse possível aquela convivência, curtir ainda mais os relacionamentos construídos ao longo de uma existência permeada de atitudes pró-ativas, de bondade, de bom –humor, de carinho com a família.
E a família foi informada de que o tratamento seria assim. De que era um paliativo. De que não havia chance de cura, mas também de que a sobrevida poderia ser longa, se a sorte nos acompanhasse. Não havia escolha, senão cumprir com a indicação médica e torcer para que Deus interferisse e, quem sabe, fizesse com que ele ficasse conosco por um longo tempo, ainda.
Marcamos com o Dr. Paulo a data da primeira alcoolização. Seria na semana seguinte. Ele deveria baixar na quarta-feira para exames e preparação. Na quinta-feira o Dr. Aldo, o radiologista, deslocava-se de Passo Fundo a Erexim e realizava os procedimentos. O pai necessitaria de pelo menos mais um dia de internação, sendo liberado na sexta-feira ou no Sábado.
Mal sabíamos todos que seria o início de um novo calvário.
O TRATAMENTO: O OUTRO CALVÁRIO
No sábado, após o término do meu curso, viajei de Passo Fundo a Erexim para buscar o pai e o Nando, que estava com ele. Ele estava bem. Mas era preciso iniciar o tratamento como forma de tentar eliminar os dois nódulos que haviam aparecido no que restava do seu fígado.
Numa conversa reservada com o Dr. Paulo, ouvi dele que o tratamento mais viável seria o que se chama de “alcoolização” dos nódulos. O procedimento consiste em se introduzir uma agulha comprida no abdômen, guiada por ultrassom, penetrando o fígado e atingindo diretamente cada um dos nódulos. Dentro do nódulo seriam instilados de 3 a 10 ml de um tipo de álcool especial (100%), que teria o poder de eliminar as células cancerosas. Era o que se poderia fazer no momento. Havia outras alternativas, como uma tal de “embolização” que consistia em injetar um tipo de espuma sintética diretamente nas artérias que alimentam os tumores, o que interromperia o fluxo de sangue, levando à deterioração do tumor. Mas isso só se fazia em Porto Alegre e era necessário o preenchimento de alguns requisitos que o pai não reunia no momento. Ficaria como uma “carta na manga”, para o caso de ele não responder bem ao tratamento com alcoolização. A boa notícia é que os nódulos poderiam ser controlados indefinidamente. Com um pouco de sorte, poderia ser possível eliminá-los com esse procedimento. A má notícia é que se tratava de um simples “paliativo”. A alcoolização é um procedimento que se usa para controle dos nódulos nos pacientes que aguardam por um transplante. Toda vez que o álcool fosse injetado nos nódulos, além das células tumorais, acabariam atingidas também células sadias, que aos poucos iriam diminuindo ainda mais a capacidade de filtragem do fígado, até um ponto em que não mais seria suficiente para mantê-lo vivo.
Obviamente não passei tudo isso para o pai. Ao contrário, mesmo abatido ao saber que praticamente não havia como curá-lo, senão apenas estender indefinidamente sua sobrevida, procurei elevar o seu astral, passando a impressão de que o tratamento seria suficiente para estender por muitos anos as sua vida, mesmo que debilitada. Deixei que imaginasse ser a sua salvação, não me importando se depois tivesse que informar-lhe que não seria um único procedimento, que seria o início de muitas viagens a Erexim a partir de então . E aí ele esboçou um sorriso, como se fosse o que queria ouvir naquele momento. Antes de tudo, ele amava a vida. Amava a família, sua cidade, seus amigos. O que ele desejava era mesmo estender o quanto fosse possível aquela convivência, curtir ainda mais os relacionamentos construídos ao longo de uma existência permeada de atitudes pró-ativas, de bondade, de bom –humor, de carinho com a família.
E a família foi informada de que o tratamento seria assim. De que era um paliativo. De que não havia chance de cura, mas também de que a sobrevida poderia ser longa, se a sorte nos acompanhasse. Não havia escolha, senão cumprir com a indicação médica e torcer para que Deus interferisse e, quem sabe, fizesse com que ele ficasse conosco por um longo tempo, ainda.
Marcamos com o Dr. Paulo a data da primeira alcoolização. Seria na semana seguinte. Ele deveria baixar na quarta-feira para exames e preparação. Na quinta-feira o Dr. Aldo, o radiologista, deslocava-se de Passo Fundo a Erexim e realizava os procedimentos. O pai necessitaria de pelo menos mais um dia de internação, sendo liberado na sexta-feira ou no Sábado.
Mal sabíamos todos que seria o início de um novo calvário.